Nesta terra de gigantes, que trocam vidas por diamantes...

2.8.06

Se for pra queimar, vamos todos nós.

Hoje resolvi postar algo diferente, talvez queime no mármore, mas não vou sozinho, vamos eu, Marco Aurélio (de quem surrupiei este texto) e o Padre Levedo.
Apresentamos aqui um ponto de vista diferente da história bíblica; uma linguagem herege?Talvez, mas é engraçada:

Elias, a seca e a viúva (I Reis 17)

No último capítulo (lá se vão três meses), vimos que a situação no Reino do Norte ia de mal a pior. Enquanto Judá vivia tempos de calmaria, com o piedoso Asa no trono, em Israel cada rei coroado era pior que seu antecessor. Essa série culminou com Acabe que, não contente em permitir que o povo adorasse outros deuses, empenhou-se ele mesmo em irritar a Javé. Para começar, casou-se com Jezabel, e passou a adorar o deus Baal. Não só isso: o rei mandou erguer um templo em Samaria em honra a Baal, para concorrer com o templo de Jerusalém, dedicado a Javé.
Lá de cima, Javé assistia a tudo isso e tentava manter-se calmo. Sentia um tremor no canto do olho direito e no lábio superior, e procurava conter-se. Sabia que, se deixasse sua ira manifestar-se de forma plena, destuiria não só Israel, mas, no mínimo, metade do Sistema Solar. Então respirava fundo, contava até 10 trilhões, e tentava escolher um profeta que pudesse enfrentar a audácia de Acabe. Pensou, pensou, e acabou escolhendo Elias.
Elias era um profeta da pequena cidade de Tisbé, em Gileade. Era um bom rapaz, trabalhador, disciplinado. Pouco conhecido fora de sua cidade, surpreenderia a todos quando começasse a falar em nome de Javé. Perfeito. Feita a escolha, Javé foi ter com o profeta.
— ELIAS!
— Quê?
— MANÉ "QUÊ"! SABE QUEM ESTÁ FALANDO?
— Assim, pela voz, não. Se você aparecesse ia facilitar um bocado.
— EU SOU O QUE SOU!
— Eu também, ué. Aquela pedra ali também. Que coisa... Olha, eu tenho mais o que fazer e...
— CALABOCA! EU SOU É DEUS, TÁ ME OUVINDO? DEUS!
— Deus, é? Qual deles? Tem um monte por aí, sabe como é.
— SOU O ÚNICO DEUS, PORRA! JAVÉ!
— Ah, esse. O que manda, Javé?
— VOCÊ NÃO VAI FICAR NEM UM POUCO IMPRESSIONADO?
— Deveria?
...
— ...
— CÊ TÁ FALANDO SÉRIO?
— Ah, pqp, até o Senhor? Por que é que todo mundo me pergunta isso?
— É ESSA SUA POSTURA, ELIAS.
— Que que tem minha postura?
— ESSE SEU JEITÃO AÍ, SEI LÁ. MEIO...CÍNICO.
— Você acha?
— CÊ TÁ FALANDO SÉRIO?
— Argh!
— BOM, VAMOS PARAR DE PAPO FURADO. VOCÊ SABE QUE ACABE TÁ FAZENDO TUDO PRA ME IRRITAR. CASOU COM AQUELA VADIA, CONSTRUIU UM TEMPLO PARA BAAL, VIVE NAQUELAS SURUBAS SAGRADAS E NÃO SEI O QUE MAIS. EU QUERO QUE VOCÊ VÁ LÁ E ACABE COM ISSO.
— Ah, é só isso? Que bobagem!
...
— Ok, ok. Continue.
— UQERO QUE VOCÊ VÁ ATÉ O PALÁCIO E DÊ UM RECADO A ELE. O RESTO A GENTE VÊ DEPOIS.

Foi assim que, no dia seguinte, Elias foi ao palácio falar com o rei.
— Acabe! Trago um recado de Javé para você!
— Peraí, peraí, peraí... Quem você pensa que é para vir aqui falar comigo nesse tom?
— Sou Elias, e trago a seguinte mensagem: não vai cair chuva, nem mesmo sereno, até que eu ordene que a chuva volte.
— Hein?
— É isso. Vem uma grande seca por aí. Só vai voltar a chover quando eu mandar.
— Porra, tu é manda-chuva, é?
— ...
— Rapaz, cê tá falando sério?
— Tô porra!
— Como é que é? Guardas! Capem esse feladaputa!
Elias ia perguntar se o rei estava falando sério, mas achou melhor sair correndo. Correu até encontrar um lugar para se esconder, e estava encolhido, recuperando o fôlego, quando ouviu a voz de Javé:
— ELIAS!
— Poxa! Quer me matar de susto?
— EPA, FOI MAL. E AÍ, COMO FOI LÁ COM O ACABE?
— Falei o que você me mandou falar.
— O LANCE DA SECA? EITA! E ELE?
— Adorou, disse que é mesmo um cara muito mau, e que merecia isso.
— SÉRIO?
— Claro que não! O feladaputa mandou me capar!
— AH... CALMA, ELIAS. FAZ O SEGUINTE: CONHECE O RIACHO DE QUERITE, PRA LÁ DO JORDÃO?
— Conheço.
— ENTÃO, VÁ PRAQUELES LADOS E SE ESCONDA POR LÁ. mESMO COM A SECA VOCÊ VAI TER O QUE COMER O BEBER, NÃO SE PREOCUPE.

Elias ficou em seu esconderijo até anoitecer, e então partiu para a região do riacho de Querite. Javé não mentira ao dizer que ele teria o que beber e o que comer, mas também não dera a informação completa. Para beber, o profeta só tinha mesmo a água do rio. Até aí, nada mau. O pior era a comida: todas as tardes um bando de corvos vinha trazar pão e carne para ele. Desesperado, o profeta se perguntava:
— Quando é que eu vou voltar a ter uma vida normal?
E os corvos respondiam:
— Never more!

Água do rio e comida trazida pelos corvos. O que parecia ser o pior possível piorou ainda mais quando, devido à seca, o riacho secou. Elias foi queixar-se com Deus, que não se deu por achado: disse que tudo estava sob controle, e que ele fosse à cidade de Sarepta, perto de Sidom, que uma viúva lhe daria de comer.
Elias foi, e já às portas da cidade encontrou a viúva catando lenha.
— Com licença, senhora. Poderia me dar um pouco d'água para beber? Estou morrendo de sede.
— Pois não, meu filho. Vou ali buscar a água.
— Ah, muito obrigado. Um pãozinho ia bem também.
— Meu filho, eu não tenho mais pão. Tenho um punhadinho de farinha de trigo e um quase nada de azeite. Vim aqui pegar uns pedaços de pau para fazer fogo para cozinhar qualquer coisa para mim e para o meu filho. Depois disso, vamos morrer de fome.
— O que é isso, minha senhora? Seja mais positiva! Pode ir preparar sua comida. Mas antes pegue a farinha e o azeite que ainda lhe sobram e faça um pãozinho para mim.
— Meu filho, não me leve a mal, mas... CÊ TÁ DE SACANAGEM, NÉ?
— Ai, meu saco... Dona, faça o que eu disse. Sou um profeta, e Javé manda dizer que não acabará a farinha da sua tigela nem o azeite do seu jarro até que volte a chover.
— Hum. Sei não...
— Pode acreditar, minha senhora. Pelamordedeus, tô seco de fome e sede!
— Tá bom, vai.
A viúva fez o que Elias tinha dito e, milagrosamente, a farinha e o azeite multiplicaram-se. Por muitos dias, os três tiveram o que comer. Infelizmente, uma dieta de farinha e azeite não é a mais indicada para uma criança, e o filho da viúva morreu.
"Efeito colateral", disse Javé. "Efeito colateral meu ovo, que agora essa velha me mata", disse Elias. Confabularam por um tempo, e lá foi ele falar com a viúva.
— Me dá aqui esse defuntinho.
— HEIN?
— Me dá o moleque, rápido!
— Você está falando sério?
— PUTA QUE PARIU, E EU IA BRINCAR COM UM NEGÓCIO DESSES?
Sem esperar resposta, o profeta pegou o pequeno cadáver, levou-o para o andar de cima e o deitou na sua cama. Feito isso, clamou aos céus:
— JAVÉ, POXA, POR QUE ME FERRASTE DESSA FORMA? AGORA A DESGRAÇADA DA VELHA VAI ACABAR COM A MINHA RAÇA! ELA ME HOSPEDOU, ME DEU COMIDA, E TU MATASTE O MOLEQUE DELA. NÃO FERRE, JAVÉ!
Enquanto orava, Elias debruçou-se três vezes sobre o menino. Na terceira vez, o menino voltou a respirar e abriu os olhos. Ao ver o profeta sobre ele, gritou:
— PEDÓFILO!
— Pedófilo é uma porra, seu moleque dos infernos. Volta correndo lá pra baixo, e calado, senão eu te mato de novo.
Ao ver o filho vivo novamente, a viúva finalmente reconheceu que Elias era um enviado de Javé. Queria sair pela vizinhança contando o ocorrido, mas o profeta lhe proibiu. Ainda era um fugitivo, afinal, e Javé não dera ordens para os próximos passos. Elias precisaria ser paciente: a seca ainda duraria três anos.

P.S
Fiz algumas modificações para deixar mais light, se quiser o texto integral, leia aqui

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